POEMA EM FORMA DE CARTA (Augusto Massi)
Quanto tempo custa a um analfabeto
empregar corretamente genitália?
Quantos textos um homem de letras
precisa escrever para usar boceta?
Quantas primaveras uma menina leva
para saltar a palavra perereca?
Quando se perde a virgindade do pema?
Por que tamanha tara pela metáfora?
Por que falar leque, búzio, flor?
A xoxota não cabe no ventre do poema?
Como arrancar o cabaço da imagem?
A musa tem orgasmo, menstrua, urina?
Como ela se refere ao próprio sexo?
Entre mulheres importa o tamanho da vagina?
No amor é possível sussurrar clitóris?
Estou cansado de tanto engenho
dos ginecologistas da língua,
das propagandas de absorvente
Por que essa palavra entre os dentes?
Não existe um ponto intermediário
onde se fundem o som e o sentido?
Onde se fodem baixo calão e dicionário?
Quantas perguntas sem resposta.
Leitor, perdoe esse perverso polimorfo,
que recifra em sêmen, em verso, em prosa,
o inexplicável lirismo da xoxota.
Fonte: Folha de São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
CÓDIGO MORSE (Nelson Ascher)
Se indagas como, assim,
sei que, no fundo, atrai-te,
mais que o de Shere Hite,
o Relatório Kinsey
e, quanto ao nosso encaixe
futuro, não me dói de-
clarar que, a Sigmund Freud,
prefiro Wilhem Reich
só para que me entendas
melhor, deixa-me, dentro
das religiões pudendas,
expor meu argumento
- com dedos – à mucosa
do teu botão de rosa.
Fonte: Folha de São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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